A FANTASIA É O FERMENTO DO MEDO

O medo toma conta da minha atenção em duas situações: quando estou no avião indo para a guerra e à noite. Eu não tenho medo de avião. Ao contrário, me sinto mais seguro nos aviões do que nas estradas. Também não tenho medo do escuro. Quando estou indo para a guerra, não tenho as tarefas da cobertura para me ocupar, a realidade dela e a interação com as pessoas para me mobilizar. No conforto e na segurança do avião, tenho só a minha expectativa do que vou encontrar. Normalmente, fico lendo reportagens de colegas que já estão lá, ou textos de história, economia, etc.

À noite, fico só com os meus pensamentos. Às vezes, ouvindo bombardeios, próximos ou distantes. Faltam outras informações, que vêm com a luz e as atividades do dia.

Exatamente por estar confortável no avião ou à noite, por não estar ocupado, que o medo emerge com força. Parece paradoxal: o medo cresce quando a ameaça é menor. Mas o medo é um sentimento. Ele pertence ao nosso mundo subjetivo. Embora muitas vezes possa ou pareça ser provocado por estímulos externos, o lugar onde ele cresce é o nosso mundo interno.

Na ausência da realidade, da experiência e da informação sensorial, a fantasia assume o lugar. A fantasia funciona como um fermento do medo. Ele cresce, ocupando o lugar que estaria reservado à informação e às tarefas do meu trabalho: ouvir, observar, contar, perguntar, anotar, gravar, filmar, fotografar e assim por diante.

(Extraído do livro “Minha guerra contra o medo: o que o risco de morte revela sobre a vida”, em breve nas livrarias)